loading . . . COP das Crianças: espaço cresce e amplifica as vozes dos pequenos; veja histórias A COP30 em Belém pode marcar um ponto de virada na participação de crianças e adolescentes dentro das negociações climáticas globais. O que antes era um espaço simbólico, a chamada COP das Crianças vem se transformando, edição após edição, em um campo de disputa política e de incidência direta sobre decisões que moldarão o futuro de uma geração inteira, justamente a que sofrerá os impactos mais severos da crise climática.
Nesta segunda-feira, por exemplo, o Instituto Alana, um dos 24 parceiros do Children and Youth Pavilion, lidera o Diálogo Intergeracional de Alto Nível sobre Crianças e Clima, na Zona Azul. O evento reunirá autoridades e representantes de organizações internacionais e apresentará o documento “Policy Paper: Children and the UN Climate COPs”, lançado este ano, em Bonn, na Alemanha, que demonstra avanços no reconhecimento dos direitos das crianças nas negociações climáticas.
— Há cinco anos acompanhamos as COPs e percebemos algo fundamental: se estas conferências definem o futuro do clima, quem viverá mais tempo com essas decisões são as crianças. Mas onde elas estavam? — questiona JP Amaral, gerente de natureza do Instituto Alana. — Desde o ano passado temos uma delegação estruturada de crianças ativistas representando seus territórios. Elas debatem, têm propostas, mas não têm acesso ao espaço de decisão. O Alana atua como plataforma para que suas demandas cheguem às autoridades.
A ciência corrobora essa urgência. Segundo dados do Unicef, 1 bilhão de crianças no mundo vivem expostas a riscos climáticos de alto grau, como enchentes, calor extremo e poluição do ar. Do ponto de vista fisiológico, os impactos são mais severos: crianças perdem mais líquido sob estresse térmico, respiram o dobro de ar que adultos — e, portanto, mais poluição — e sofrem efeitos duradouros de traumas ambientais na saúde mental.
Sophia Soares de Oliveira e Melissa Kuraba Akiyama, do colégio Magno, foram selecionadas pelo projeto "Decarbonize" para participar da COP30
Divulgação
Espaço em crescimento
Este ano, mais de 160 crianças conseguiram acessar a Zona Azul, área oficial de negociações da ONU, um número inédito e ainda pequeno diante dos 55 mil credenciados, mas que evidencia uma curva ascendente. Só a delegação da iniciativa global #Decarbonize, do Centre for Global Education, trouxe 30 crianças e adolescentes, representantes de escolas de mais de 85 países, responsáveis por apresentar aos negociadores o manifesto produzido por eles ao longo do ano.
Sophia Soares de Oliveira e Melissa Kuraba Akiyama, ambas de 15 anos, foram algumas das jovens selecionadas a participar da COP das crianças pelo projeto. Alunas do Colégio Magno, de São Paulo, elas levaram os projetos ambientais da escola, como coletores de lixo, biodigestores, hortas sustentáveis e monitoramento de córregos para apresentar no evento.
Tiveram encontros com autoridades, representantes de importantes organizações, como o Instituto Chico Mendes, e troca de experiências com crianças e adolescentes de todo o mundo.
Moradora de São Paulo, Sophia sofreu com as fortes chuvas na cidade, em outubro passado. Janelas quebradas, móveis perdidos, e dias sem luz impactou a vida da jovem, que acredita na educação como pilar.
— As vozes jovens são muito importantes. Nesse momento, não temos o lugar que gostaríamos. Os adultos acabam esquecendo tudo o que aprenderam na escola, por isso é importante focar na educação — diz Sophia.
Desde sua criação na COP27, em Sharm el-Sheikh, o Children and Youth Pavilion se tornou uma das estruturas que mais crescem dentro da conferência. Idealizado e operado por jovens, o espaço parte do princípio de que crianças não são apenas “futuras lideranças”, mas agentes atuais de solução.
A programação, construída integralmente por jovens, aborda desde educação climática e engajamento científico até saúde mental, justiça climática, saberes tradicionais e diálogo intergeracional.
Catarina Lorenzo, uma das jovens ativistas da COP das Crianças
Divulgação/Instiuto Alana
Apesar dos avanços, a inclusão plena está longe: muitas vezes, a presença juvenil se limita à observação, não à influência. O Pavilhão tenta romper essa barreira ao criar oportunidades estruturadas de incidência em vez de aparições simbólicas.
—A participação não pode ser decorativa. As crianças já estão testando soluções nas comunidades, promovendo educação climática e conectando ciência e cultura — afirma Rebecca Moon, do Grupo de Trabalho de Comunicações do Children and Youth Pavilion.
A força das vozes jovens
De família com raízes da etnia pataxó no Sul da Bahia, Catarina Lorenzo, de 18 anos, é surfista de ondas grandes e parte do movimento SOS Vale Encantado, em Salvador, que batalha pela preservação de uma grande área de Mata Atlântica. A jovem, que escreve cartas a autoridades desde os 7 anos, tornou-se uma das 15 crianças do mundo a denunciar alguns países à ONU por negligência climática. Hoje, é jovem embaixadora do Unicef e segue cobrando responsabilidade intergeracional:
— O número de crianças aumenta, e o espaço começa a se abrir. Mas não basta estar aqui. Precisamos que nossos direitos sejam prioridade nos documentos finais — diz Catarina, que começou a faculdade de economia e ciências de dados, com foco em sustentabilidade.
O colombiano Francisco Veras, de 15 anos, foi a primeira criança a participar da COP
Divulgação/Instiuto Alana
Criado entre Bogotá e Villeta, cercado por biomas diversos, Francisco Vera Manzanares, de 16 anos, participou dos seus primeiros protestos na Colômbia, em 2019. Foi, aos 11 anos, a única criança na COP27, no Egito:
— Nas últimas COPs, passamos de uma criança para mais de 150. É uma mudança real rumo ao reconhecimento de que nossa voz conta.
Francisco ressalta que não faltam soluções científicas para a crise climática, mas vontade política.
— A pressão da sociedade civil é o motor de qualquer mudança social. Jovens são, historicamente, catalisadores de transformações.
O impacto nas decisões
Nos últimos anos, a pauta da infância passou a ser incorporada em documentos oficiais sobre a crise climática. Na COP29, em Baku, a meta de adaptação decidiu que devem ser incluídos, entre outros pontos, "indicadores que reflitam as vulnerabilidades únicas das crianças aos impactos das mudanças climáticas em todas as metas temáticas e, potencialmente, indicadores transversais relacionados à educação e à saúde de crianças e jovens".
A expectativa para Belém é que as negociações avancem na prioridade às crianças nos seguintes aspectos: reconhecimento oficial de que são as mais afetadas; inclusão explícita de seus direitos em decisões; diretrizes para educação climática e saúde mental; mecanismos para participação real, e não apenas simbólica.
— Se queremos uma transição justa, ela não pode excluir aqueles que viverão mais tempo com as consequências — resume Amaral. http://dlvr.it/TPK3YN